CONTRATOS ADMINISTRATIVOS
Parcela significativa das despesas públicas realizadas pelos municípios, são feitas mediante contratos que estabelece com terceiros. São os chamados contratos administrativos, firmados na maioria das vezes para fornecimento de bens, para a execução de serviços e realização de obras de que o poder público necessite (não trataremos aqui de contratos mais complexos, como os decorrentes de PPPs, por exemplo. O foco, nessas considerações preambulares não é o aprofundamento de temas específicos).
Entender o mecanismo desses contratos, efetuar uma gestão efetiva sobre eles, e dispensar a atenção devida a esses instrumentos jurídicos pode, de um lado, poupar o administrador de diversos problemas e dissabores futuros, assim como pode contribuir para uma gestão efetiva da administração, e mesmo servir de mecanismo eficiente para o equilíbrio das finanças públicas.
Diante dessa importância que permeia os contratos administrativos, algumas considerações iniciais são prudentes nesse momento (lembro que são anotações genéricas, que merecem e justificam um aprofundamento).
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O que devo conhecer dos contratos administrativos para iniciar o mandato?
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Vencidas as eleições, é fundamental conhecer quais são os contratos administrativos vigentes na Prefeitura e nas entidades da administração indireta (autarquias, empresas públicas, etc).
Assim, deve-se solicitar uma listagem desses ajustes, que é sempre o caminho mais confiável para a obtenção da informação, podendo buscar meios remotos para auxiliar nisso, como o portal de transparência do município, o site do Tribunal de Contas.
De posse das informações, deve-se priorizar a análise de questões mais específicas (é utópico pensar que até a posse dará tempo para ver todos os contratos). Assim, sugerimos verificar em especial:
- os contratos que vencem no final de 2016;
- aqueles que vencem no primeiro trimestre de 2017;
- os contratos de serviços continuados; e
- os que referem-se a fornecimentos e serviços essenciais.
Esses contratos devem ser analisados individualmente.
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O que deve ser analisado nesses contratos?
Solicitados e recebidos os termos contratuais, é importante analisar, nesse período inicial (é óbvio que trata-se apenas de uma ação imediata, para tentar corrigir rotas e procedimentos, e minimizar os impactos futuros. No início do mandato, novas análises, mais detalhadas e eficazes serão necessárias) , alguns aspectos:
- se o objeto é executado respeitando as propostas do plano de governo que se instaurará em 2017;
- qual a vigência do contrato e quais as eventuais formas de prorrogação de seu prazo caso essa vigência possa trazer impacto para o início do mandato;
- se o contrato sofre alguma espécie de crítica pelos órgãos de controle e judicialmente;
- qual o impacto desse contrato nas finanças municipais, e o que pode ser feito de imediato para alterar isso.
Vejamos cada uma dessas vertentes de análise.
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Verificar se o objeto é executado respeitando as propostas do plano de governo que se instaurará em 2017.
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É de fundamental importância essa verificação.
É obvio que não significa que se o contrato contiver objeto destoante do plano de governo (ou estiver sendo executado de forma diversa do pretendido) no dia 1o de janeiro será de plano rescindido. Isso no mais das vezes não é possível, seja pela necessidade de cumprir o ajustado (que em linhas gerais prevalece) seja pelo fato de que as modificações necessárias para tanto são demoradas (terá que ser feito estudo para viabilizar a pretensão do plano de governo, depois preparar todo o procedimento licitatório, para ao final ter o contrato na forma pretendida).
Essa verificação de compatibilidade deve ser realizada de forma ampla, não apenas formal e documental. Para que seja efetiva, deve envolver os futuros responsáveis pela execução desse objeto, e um levantamento de campo para investigar as reais condições de execução do contrato.
Um exemplo melhora a intelecção: suponha um contrato de fornecimento de merenda escolar pronta (refeições servidas aos alunos), e a pretensão do novo governo de realizar esse fundamental serviço aos alunos preparando a merenda em cozinhas das escolas, com as próprias merendeiras da Prefeitura, comprando apenas os insumos. Obtendo a cópia do contrato, deve-se ver como é executado, envolvendo a futura equipe que dirigirá a secretaria de educação, consultando as escolas (professores, diretores) visitando os locais, para saber se será possível a mudança. Se isso for viável, outras questões (vistas a seguir) devem ser investigadas.
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Saber qual a vigência do contrato e quais as eventuais formas de prorrogação de seu prazo caso essa vigência possa trazer impacto para o início do mandato.
Nos contratos analisados, deve-se verificar em especial a sua vigência, ou seja até quando está contratada a execução e analisar a possibilidade de eventual prorrogação.
Os contratos de fornecimento de bens e produtos, em regra têm sua vigência prevista pelo período de um ano, e deve-se ter cuidado para o término desses contratos em final e início de mandato.
Os contratos de prestação de serviços continuados em geral podem ser prorrogados por mais períodos, até o limite de 60 (sessenta) meses, desde que autorizados na licitação que o precedeu e no próprio termo contratual.
Contratos de obra, por sua vez, trazem prazos específicos, no entanto são tratados como contratos de escopo (busca-se a execução daquele objeto, o escopo, a obra).
É necessário ainda saber se o contratado está recebendo adequadamente pelo fornecimento , pelos serviços e pelas obras em execução, pois a ele assiste o direito de interromper a execução contratual se não estiver recebendo a mais de 90(noventa) dias, podendo trazer sério impacto para a administração e para a prestação de serviços públicos importantes.
Voltando ao nosso exemplo, da merenda, trata-se de contrato de prestação de serviços continuados, de modo que em regra é firmado pelo período de 01(um) ano, renovado por iguais e sucessivos períodos até o limite de 60 (sessenta) meses. Analisado o ajuste, essa informação torna-se essencial para as providências futuras da nova administração. E se o contratado não estiver recebendo, uma preocupação a mais se apresenta, diante da possibilidade de suspensão da execução contratual, nos termos mencionados.
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Verificar se o contrato sofre alguma espécie de crítica pelos órgãos de controle e/ou judicialmente.
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Deve-se verificar ainda se referidos contratos são objeto de alguma forma de investigação ou crítica dos órgãos de controle, em especial o Tribunal de Contas, e se estão sofrendo questionamento judicial (mormente os conduzidos pelo Ministério Público).
O Tribunal de Contas investiga esses contratos em função de seu valor (alguns, de maior valor são sempre investigados), em face de representação ou denúncia, ou nas contas anuais da Prefeitura.
Na esfera judicial, o que mais ocorre é o questionamento dos contratos (e das licitações) pelo Ministério Público, mediante ações civis públicas e de improbidade administrativa.
É certo que os contratos foram firmados pela administração que está por terminar. Ela fez a licitação, assinou o ajuste e está executando. Contudo, a responsabilidade, especialmente pela execução e eventuais prorrogações, pode atingir o novo mandatário, sem contar que providências e decisões adotadas e determinadas, podem trazer sérios impactos à execução futura do objeto do contrato, esta a cargo dos Prefeitos que assumem em janeiro de 2017.
Novamente no exemplo da merenda: um julgamento definitivo do Tribunal de Contas pela irregularidade do contrato, ou uma decisão judicial estancando a execução contratual, poderá trazer sérios impactos para o fornecimento de merenda, de forma que é de suma importância conhecer e acompanhar a existência dessas análises (ter conhecimento das investigações e de seus teores serve também para orientar mudanças de rumo do contrato, definir a premência de novas licitações, e outras medidas).
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Verificar qual o impacto desse contrato nas finanças municipais, e o que pode ser feito de imediato para alterar isso .
Tem sido recorrente a adoção de medidas iniciais dos administradores que assumem as Prefeituras Municipais, no sentido de decretar verdadeira moratória nos pagamentos dos contratos administrativos.
Essas medidas justificam-se por um período curto, inicial, para conhecer o cenário e a realidade econômica e financeira da administração, os valores dos contratos, sua compatibilidade com os preços de mercado, dentre outros.
A análise preliminar dos contratos, feitas da forma aqui sugerida, permitirá aos futuros administradores saber antecipadamente se medidas dessa natureza serão necessárias.
Se for o caso de adotá-las, o melhor caminho é a edição de decreto regulamentando o procedimento.
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Uma palavra sobre as contratações emergenciais.
Por fim, uma palavra sobre as contratações emergenciais.
É indubitável que a Lei 8666/93 contempla a hipótese dessas contratações com dispensa de licitação (artigo 24, IV).
É inquestionável também que ainda nos dias de hoje alguns administradores que deixam os mandatos criam verdadeiras armadilhas para seus sucessores.
Contudo, tem que se ter presente que a contratação emergencial, prevista na lei não é panacéia para todos os males, não se apresenta como varinha de condão para solucionar todos os problemas.
Ainda que as investigações e análises futuras venham a levar em consideração a circunstância de que se está diante de período de início de mandato, outras variáveis serão consideradas, em especial as providências administrativas adotadas por uma e outra gestão para o planejamento da contratação.
Marcelo Palavéri. Advogado, sócio do escritório Miranda Rodriguez e Palavéri Advogados, especialista em Direito Municipal, e Presidente do IPGM – Instituto Paulista de Gestão Municipal.